segunda-feira, 30 de junho de 2008

ENTRE E.T.s E "US ÔMI"


Domingo frio e acabei vendo um filminho com as crianças.
Eu lá, vendo filme infantil, nem aí prá nada além da pipoca. Só que a diferença básica: era o filme do E.T: O extraterrestre. Filme vai, filme vem, caio eu no choro lá de longe, lá da infância, lá do cinema desde a primeira vez que pude ir sem adultos cuidando de mim. Só nós, os amigos, as crianças.
Me senti até intrusa daquele momento tão infantil.
É que esse fato corriqueiro, no filme do E.T., muda tudo. (Quem não viu, não merece. Corra. Ainda dá tempo).
Lembrei de como aquele filme me marcou, pois comecei a prestar atenção ao seguinte: Enquanto o mundo está povoado por crianças, cachorro e extraterrestre, tudo dá certo!
Mas chegam os homens...
Degringola tudo. É uma choradeira sem fim. É a ameaça que nunca acaba.
Senti mais ou menos a mesma coisa ao ver King Kong, quando primeiro tiram o pobre macaco da floresta. E depois, sem saber o que fazer com ele, matam o coitadão.
Impressionante né?
Acho que a sensação pós E.T./ King Kong veio à tona mesmo quando li os jornais a respeito da zona sul se mobilizando prá contratar milícias prá tomarem conta da segurança.
"Chama 'us ômi'" é a pedida. Mesmo quando a gente lê também que um menino (18 anos é menino, sim) é morto na porta de uma boate por um policial contratado prá fazer a segurança de outro menino.
Não é por nada não, mas esse negócio de chamar os "adultos" armados prá tomar conta das crianças indefesas - nós - não me desce pela goela. Nem com milícia nem com exército.
Prefiro as crianças...
Os cachorros...
Os macacos...
Os E.T.s...

quinta-feira, 19 de junho de 2008

REPETINDO...


Criança é fogo!
A gente acaba de contar uma historinha e ela vem com a frase que mata qualquer adulto de sono:
- Conta de novo?
É que assim ela vai elaborando a história.
Vai elaborando. Vai digerindo... Num gerundismo obrigatório e quase contínuo que a persegue até...
Aí vêm os adultos, esses seres de outro planeta, e dizem que estão cansados de tanto repetir a mesma história. Sem se darem conta de que eles mesmos, os ETs, repetem suas próprias histórias incessantemente.
Eu, adulta e ET que sou, caí nessa esparrela no último post, e me vi escrevendo sobre a mesma coisa que já havia escrito antes.
Só percebi isso depois. Depois de uma sensação de deja vu tomar conta de mim e incomodar.
Concluí que no primeiro texto sobre esse assunto, ficou faltando alguma coisa que precisava ser dita, revista, ou meramente mencionada. E talvez por isso eu tivesse necessidade de ficar num blá blá blá de refrão. Até achar a tal coisa. Até achar a diferença. Até FAZER a diferença.
E feito máquina do tempo, tentei voltar prá resolver o que não estava definido. Voltar ao que "não deu certo", ao imperfeito (= pouco feito), ao que não foi mastigado, deglutido, engolido, digerido enfim.
Por que falo do meu processo criativo?
É que a repetição, como a das histórinhas, não acaba com a infância. O tempo todo a gente risca o disco prá ficar na mesma estrofe. O raro é perceber em cada repetição um solo diferente.
Mas afinal, por que repetimos?
Marque sua hora que a gente pesquisa isso junto.

sexta-feira, 6 de junho de 2008

PELA SAÚDE DA LOUCURA



O festeiro Dioniso, nos momentos que sucumbia às pragas de Hera - a madrasta -, enlouquecia por aí, perdido, errante, sofrido, e procurava sua "curandeira" avó Réia para que o salvasse da dor.
A sábia avozinha levava o jovem às profundezas da desrazão, para que enlouquecesse de verdade, e só então pudesse sair da crise.
É que desse jeito ele mergulharia fundo, grande, delirantemente, até que nem soubesse mais nada de si e perdesse aquela certeza burra que às vezes nos assola, privando-nos de experimentar qualquer sensação ou ação nova, para ficarmos seguros, presos, no que já delimitamos como o que seja nós mesmos.
"Eu sou assim. Só durmo de luz acesa. Me conheço. Nem adianta tentar mudar. É da minha natureza."
Isso tudo pode aparentemente ser reconfortante, já que brigar com o 'destino' daria um trabalhão danado. Daí o fato de a gente procurar um nível suportável de sofrimento e ficar preso ali, sem sair, como se fosse sina da vida.
O trabalho de análise está mais ou menos associado ao de Réia - que não sem querer significa fluxo - possibilitando ao analisando que ele consiga transitar um pouquinho dentro do que já conhece de si, e entre o que nem experimentou ainda, entre o que ele sequer se achava capaz de realizar.
Depois o paciente escolhe o que quer.
Mas pelo menos tenta, ousa, 'enlouquece' mundo afora, pois começa a provar umas frutas exóticas, umas fantasias novas, umas 'maluquices' e extravagâncias antes inaceitáveis. Afinal, provar dessas coisas pode ser uma ameaça de perder o controle de tudo.
... E vai que saímos gargalhando por aí, de braços dados, cantarolando, absolutamente desgovernados... Já pensou se nos descobrem? Já imaginou se percebem que não precisamos controlar as risadas prá viver?

*foto: Luciano Máximo (Summer in Salemo)