sexta-feira, 19 de junho de 2009

...AOS PORCOS?

Vez em quando ouço por aí como Fulano ou Cicrano têm vontade de fazer análise, mas... é muito caro. E pergunto, provocando: - Mas custa quanto? Resposta certa e invariável: - Não sei. Mas é caro. Melhor gastar essa fortuna no bar, no shopping, no salão de beleza ou numa orgia qualquer. Lembro de quando eu era criança e ganhava dinheirinho prá comprar balas. Se eu quisesse fazer qualquer outra coisa, não conseguiria, mas aqueles trocados davam prá pagar um montão de balas. E assim, me achava riquíssima. Era tudo o que eu tinha, e era tudo o que eu podia comprar. Se a infância tivesse prazo de validade e acabasse assim que começasse a pré-adolescência, tudo bem. Passado seria passado e estaria lá longe, num tempo inalcançável, pois dizem que o tempo não volta. Porém, ah porém... Costumo encontrar crianças de TODAS as idades em qualquer esquina. E as mais crianças de todas são as que compram balas e brinquedinhos como moto, carro, lancha, roupa de princesa e etc. até hoje por acharem qualquer outra coisa que as faça crescer muito além de suas possibilidades. São as crianças aprisionadas em corpos de adultos, que já podem comprar brinquedos, mas se esqueceram de como é que se brinca. Não discordo de Fulano e nem de Sicrano. Análise é caro, sim! Caro porque dá trabalho. O trabalho de sair desse lugarzinho chato, dessa cadeirinha de faquir cheinha de pregos que incomoda tanto, mas que parece que nos cabe tão "bem". E de mais a mais, ninguém tem tempo prá essas coisas (essa é a segunda desculpa prá não se fazer análise). Ninguém tem tempo nem dinheiro prá essas "bobagens" que fazem a gente pensar e inventar dialetos numa cumplicidade resgatada. Que fazem a gente vivenciar mitos, produzir personagens e fugir de mera reprodução do cotidiano. Que possibilita um sem número de variações criativas (é disso que se trata uma análise) que nem todas as crianças podem ter, pois a maior parte delas só chupa balas. E prá não pagar esse preço altíssimo, dá-lhe contar problema em fila de banco, em banco de táxi, em boteco pros "amigos" que não ouvem mais nada. A semeadura foi feita no asfalto. As pérolas foram dadas aos porcos. E os pobres coitados não têm a menor ideia do que fazer com essa poesia toda. E seguir criando, continuar investindo, sem ninguém prá ver esse espetáculo todo que é o movimento ganhando novas dimensões fica meio chato, sem motivo ou propósito, estéril enfim. Deixemos aos porcos só suas lavagens. Que tal produzirmos joias?

terça-feira, 16 de junho de 2009

TRADUÇÕES



Lembro até hoje de quando li um certo autor clássico e de como me embrenhei naquelas páginas guerreiras e heróicas me sentindo das mais nobres pelo simples fato de estar eu ali, com o livro na mão, entrando numa história que não era minha. Aparentemente. Mas que me fazia entrar e ficar bem à vontade.
Pouco tempo depois sai fresquinho do forno, ao alcance de todos nas bancas de jornal, uma outra história do mesmo autor.
E eu não conseguia entrar em nada...
Lia, relia, me perdia nos parágrafos e frases mal feitos. Até que percebi que tinha nas mãos não um livro, mas uma heresia. Um pecado. Uma hýbris das mais cruéis. Assassina, esquartejadora, impossibilitadora de me dar o passe para aquela história.
Uma tradução péssima de uma obra de arte.
Larguei o livro de mão e esperei lançamento de outra editora, já que não falo grego. O que mais havia de se fazer?
Comecei então a desconfiar bastante das traduções. E a frase tão famosa que se anuncia por aí, que prá bom entendedor pingo é letra, ganhou (ou perdeu) um sentido especial prá mim dentro e fora da clínica, quando dela também desconfiei.
Não é nada raro a gente ouvir - 'Fulano disse isso, como quem quer dizer aquilo.'
Aí está o outro lado da moeda da comunicação. A da interpretação ruim. A de achar que entende tudo antes mesmo que o 'tudo' seja dito. A de decifrar o que não está escondido. A de procurar códigos, escritos, sentidos ocultos onde está tudo límpido e claro.
E assim começa um novo ciclo das traduções. Aquelas às pressas, ansiosas, quase hipermétropes, que não conseguem enxergar um palmo à frente, mas ao mesmo tempo crêem enxergar lonnnnnnnnnnge.
Tão longe que nada podem ouvir.