sábado, 4 de dezembro de 2010

FOI FALTA?

ele chegou reclamando do corpo.
Tonturas, taquicardias, dores, suores, e medo, muito medo de sentir sua carcaça.
Esse corpo imperfeito e exigente, cheio de vontades e pedidos que ele nem sequer sonhava escutar, muito menos atender.
Essa sujeira pulsante toda que esfrega na nossa cara o quanto somos pequenos, como temos parcos poderes diante do mundo.
Essa paga que carregamos em carne viva, quase morta, mas viva.
ele chegou reclamando dos outros:
"Eles dizem que eu tenho é falta de Deus. todos dizem que é falta de Deus."
ele, assim minúsculo, que vai à igreja, que é cristão, que ora com fervor e não se entrega aos prazeres, teve um chamado.
Não veio do dedo em riste saindo das nuvens. Não veio de voz e trovão. Não veio nem de visagem ou aparição.
O buraco era bem mais embaixo.
Era o corpo gritando. E como berra o desgraçado!!!
Solta a voz desesperado, com pavor da morte e das sentenças acusatórias que vêm de todos os lados:
"Você está com falta de Deus. Se pega com o divino, menino."
Ó a confusão!!!
Eu, que desconfio de rimas, me ajeito na cadeira e ouço.
Ouço tanto grito que me sinto até médium visitando presídio.
É que tem hora que parece que Deus comete falta mesmo.
E falta grave!
Dá bico na canela, joelhada, fratura o pé, quebra costela, mandíbula e nariz, enfia o dedo no olho,... Puxão de orelha é brincadeira de criança. Puro treino.
Dizendo meu amigo Cacá Pereira: "Deus tem um joystick. E joga playstation com a gente.
Aperta o 'slow', e o sujeito perde o emprego em dezembro.
Aperta o 'mute', e ninguém escuta o coitadinho."
Aperta o 'repeat' e tá a gente ali robotizado, sem entender como foi parar ali naquela cena de novo, apesar de o cenário até parecer diferente.
Daí tem hora que a única coisa que a gente consegue gritar é por socorro, rezando pra maca chegar logo.
Ai esse corpo que grita. Ai essa dor de alma. Ai de mim, ai de mim! Ai de mim que sou pequeno nessa briga.

Ai que ser humano dá um trabalho danado...

sábado, 20 de novembro de 2010

Sempre ELE.

"Nunca conheci quem tivesse levado porrada.

Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,

Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,

Indesculpavelmente sujo,

Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,

Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,

Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,

Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,

Que tenho sofrido enxovalhos e calado,

Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;

Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,

Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,

Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,

Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado

Para fora da possibilidade do soco;

Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,

Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.


Toda a gente que eu conheço e que fala comigo

Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,

Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...


Quem me dera ouvir de alguém a voz humana

Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;

Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!

Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.

Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?

Ó príncipes, meus irmãos,


Arre, estou farto de semideuses!

Onde é que há gente no mundo?


Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?


Poderão as mulheres não os terem amado,

Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!

E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,

Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?

Eu, que venho sido vil, literalmente vil,

Vil no sentido mesquinho e infame da vileza."


Poema em linha reta


Fernando Pessoa  (Álvaro de Campos)

Prá sair do tema das eleições, ultrapassado, bolorento e putrefato, volto das cinzas com o melhor da vileza.
Apelo pros realmente bons.
Nem vou tecer comentários. Cada um entenda como quiser. Ninguém tem razão. Só ele.
Depois 'maltracejo' mais.
Breve,
Neste mesmo blog.

domingo, 17 de outubro de 2010

SOBRE ELEIÇÃO

Fico aqui folheando jornais, revistas e buscando comentários dos outros no facebook e cia. pra ver o nível dos nossos concorrentes à presidência.
Além do impasse sério de faltar educação, saúde, saneamento, e o escambau de boa qualidade, fico sempre com a impressão de que não tenho alguma informação importante. Que perdi alguns capítulos, me chocando com as fotos: "Como assim esse político aí do lado desse outro?" 
Claro, se a escolha é pra presidente, faz parte do processo achar que ELES é que sabem das coisas. E que eu, mera insignificante, não sou digna de dar pitaco em coisa nenhuma. E ainda me dizem: "É. Você não entende da necessidade dos jogos. ainda é muito ingênua."
Só que cada vez que vejo os fãs dos candidatos, pois as discussões parecem escolher o ídolo mais talentoso, ou o menos perigoso, o tal do menos pior, só consigo me lembrar de uma cena do Fellini em que uma galinha hipnotiza um suposto mágico que tentava, por sua vez, hipnotizá-la.
Todo mundo falando que a escola agora é boa. E que a educação melhorou muito. Mas o voto de cabresto é que aumentou seu poder de fogo.  Agora ele lida com umas paixões absolutas. E como boa paixão, cega.
E a briga agora é do destro contra o ambidestro. Pois a esquerda, de tanto perder de vista a cadeira pra canhoto, aprendeu a usar a mão direita com muita propriedade.
Nem me venham com conversa de 'to be or not to be' comunista.
QUALQUER regime totalitário que proíba as pessoas de se expressarem é ditadura. Aí nem precisa eleição.
Os argumentos de agora são ainda muito pueris e tribais. Devotos, com medo de maldição e do canibalismo da tribo vizinha. Adoração a deuses chinfrins e medíocres demais.
Ficou a briga do Chuck contra o Nosferatu. E tudo em nome de Deus.
Nesse quesito, fico sempre com os gregos, bem mais interessantes.
Por aqui? Muito mágico pra pouca galinha.
Os ditos pensadores, formadores de opinião, já foram devorados pelas raposas velhas há muito tempo.
E nem se deram conta disso...
Uns dizem que a miséria acabou.
Acabou como? Foi exterminada? Se ainda tem mão de obra escrava, a miséria impera. Se cidades inteiras sobrevivem da prostituição infantil que faz o capital girar, a miséria manda.
Sumiu a miséria? Para debaixo do tapete? 
Se contamos ainda alguém que seja 'o dono' de um Estado inteiro, a miséria tá braba.
Ou foi a classe média que baixou o nível?
Eleição, pra mim, tinha que ser que nem concurso público da Cespe.
Com prova de redação, interpretação de texto, coerência de ideias, e até exame admissional.
Sem falar na questão errada que anula a certa.
Mais ou menos assim: a gente escolhe um prá votar, e outro prá "desvotar".
Ganha quem tiver mais votos. Mas não pode zerar.
E se ninguém passar?
Ué, faz outro concurso. Até preencher a vaga com gente competente e bons projetos.
Mas o que é que a gente faz com as torcidas da rinha né?

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

JÁ NÃO SE FAZEM MAIS ATEUS COMO ANTIGAMENTE...


Houve um tempo em que ser Ateu era sinal de ser grande homem.
O cara que afirmava isso podia bater no peito forte e bradar: "Se eu esperar Deus, não acontece nada. Melhor eu arregaçar as mangas."
E saiam pelo mundo fazendo acontecer um montão de coisas que nem eles se sabiam capazes.
Era gente que não cria em Deus e muito menos em Igreja. Temor? Nenhum. Vontade? Toda!
Não falo daqueles napoleões megalomaníacos e perversos, que escravizam os outros achando-se os iluminados. Até porque estes são bastante crentes. Basta perguntar e eles respondem: "Se creio em deus? É claro que sim. EU SOU DEUS!"
E falam até com eco que é prá dar um efeito de montanha.
Destes, convém manter distância.
Falo de uns outros que se cansavam de esperar que autoridades resolvessem seus problemas, que não reconheciam a igreja capaz de balizarem seus desejos. Que não conseguiam se enquadrar na mediocridade nem para fazerem o mais simples.
Afinal, até pra ir à padaria é necessário abraçar a causa, ou se come biscoito dormido, vencido no mês passado.
Todos estes esbarravam sempre numa questão das mais cristãs, que era o tal do "Vinde a mim as criancinhas."
Não para "pedofilar."  Mas para trocar potências, exercidas através de uma espécie de orfandade.
Supostamente, um desamparado protege outro. E todos se protegem assim.
Matemática simples e justa. Nada para o pós-morte. A hora de fazer é já.
Onde foram parar estes daí?
Não sei se devido à chegada do terceiro milênio, com promessa de volta de Jesus a qualquer instante, os sobreviventes destas idéias se cansaram e mudaram pra um sítio bem longe qualquer.
Melhor olhar os passarinhos...
O que ficou foi o desamparo sim, mas agora com o abandono escamoteado, disfarçado de proteção.
O arcebispo Dom Dadeus, defendendo a igreja de mais um escândalo e ligando vários ventiladores em todas as direções, afirmou que "A sociedade atual é pedófila."
A declaração gerou uma porção de repreensões dentro e fora da igreja, mostrando que a imagem no espelho dessa vez foi forte demais. O brilho refletido cegou.
Algo semelhante já fazia Freud, quando causou uma barulheira danada apontando os abusos infantis que vinham à tona em seu consultório, falando mais ou menos a mesma coisa.
Lá e cá ficamos todos reclamando e repetindo alto: "Que absurdo! Que horror! Lá em casa não."
Como se o único pedófilo na história fosse o que abaixa suas calças.
E o esquema em torno?
E a mãe da criança, que jamais acredita nela, repreende: "Menina má. Aquele que seu dedo aponta é um santo homem. Mentirosa!"  Ou ainda: "Filha, ele que sustenta a gente. Melhor você aguentar."
E a pequena vira arrimo de família, por mais que a exploração do trabalho infantil se diga proibida."
E o taxista que lhe apresenta os gringos? 
E o dono do hotel onde aquele cara de 2 metros e 120k leva os(as) menininhos(as) de 5 anos?
Mas o que isto tem a ver com o ateísmo né?
Com aquele que fazia por si mesmo? Nada.
Com este que se vê tão pequeno que é melhor nem se mover? Tudo.

Não fosse o ato de lavar as mãos e ser cúmplice de estupros, de extorsões, de explorações escravizantes e de roubos de donativos, ao invés de testemunhos das vítimas.
Não fosse a impossibilidade de questionar informações graves, sempre em nome de um poderoso.
Os ateus de hoje não crêem em Deus. Óbvio. "Deus está morto!" Mas acreditam piamente em políticos que se denominam pais e provedores com dinheiro público, em chefes, em esquemas corruptivos, em policiais, em desembargadores, em coronéis nordestinos, em funcionários candangos com cuecas e meias repletas de dinheiro ... E desacreditam, invariavelmente, as vítimas.
E para desespero da lógica, esses pobres infelizes ateus novos não verão nem a cor da herança, já que não passam de bastardos.
Não há DNA que dê jeito nisso.
Daí fica meio inglório romper as correntes do escravo se ele jura que foi escolhido como o dileto capitão-do-mato.

domingo, 5 de setembro de 2010

FREUD EXPLICA?

Uma de minhas frases preferidas ouvidas por aí, não se sabe onde, não se sabe de quem, é:
"Quem sabe faz, quem não sabe, ensina."
Claro que sempre impliquei com professores ruins, que não têm a menor idéia de como aquela parafernália que ele tá explicando funciona na prática.
Aliás, prá que serve uma explicação?
Desconfiada que sou, sempre fico de orelha em pé quando alguém começa a se explicar.
- Minha mãe não me acordou prá prova.
- Não é nada disso que você está pensando, ela só estava fazendo uma massagem.
- O policial era esquizofrênico.
- Blá, blá, blá, blá, blá, blá,...
Todas estas, e muitas outras, sempre tentam dar conta de um erro, um vacilo, um deslize.
O deslize de se deixar pegar.
Já dizia Freud, faz tempo, que a culpa é anterior ao crime. Daí o crime perfeito ser exatamente o que deixa pistas, para que o sujeito possa ficar explicando o inexplicável por aí e, assim, sossegue de seu peso.
O peso agora vai para o outro, que morre de raiva, que morre de tédio, que morre de dor-de-cotovelo, abandonado com tanta perversidade travestida de franqueza, tanta "sinceridade" desnecessária.
Mas, cá entre nós, não tem nada mais chato do que alguém que explique.
Só de alguém tomar essa atitude, a gente já se prepara: Ihhhhh, lá vem enrolação!
E se deixa ludibriar por aquelas cenas absolutamente surreais narradas.
Outro dia, uma amiga me contou uma cena em que ela chorava na frente do namorado ao ouvir uma música.
Ah,... a música que leva a gente prá uns períodos da vida que a gente jurava superados.
Ele pergunta o que é.
Ela explica: Papai nunca me amou. Mamãe me maltratou.
Outro velho blá, blá, blá...
Óbvio que ela pulou a parte do ex, que sempre tocava justamente aquela música, e que a rejeitou.
Havia uma rejeição ali. E era tudo daquilo dito. E não era nada daquilo também...
O atual, condoído, penalizado com sua amada, lhe jurava amor eterno e tentava resgatar-lhe da torre.
Ela prometia pensar.
Pensar, pensar, pensar, e consultar os pais.
Entendeu?
Mas não é prá entender mesmo.
Explicação é assim. É só prá ter descarga.
Só prá disfarçar um desejo não assumido assim em público, sem olhos nus, sem cara à tapa.
Aí a gente vai falando, falando, até o outro encher o saco de ouvir e ir embora.
Finalmente!

Não faço a menor idéia se a humanidade tem jeito. Mas que ela conta com uma lógica absurda, ah, disso não resta dúvida.

terça-feira, 20 de julho de 2010

MUITO BARULHO POR NADA

No princípio era o verbo...
Alheio!
O bebezinho esticava o dedinho e logo vinha a explicação da mãe - "Ele quer água".
Depois vieram o desenho, o cinema, a novela, a música, a literatura, os ...
Incrível como tem gente capaz de escrever e descrever exatamente o que sentimos.
Se é prá falar de amor e conquistar a dama, saque logo um Chico Buarque que a moça é sua.
Se é prá falar de dor de corno, uma banda de pagode com gente grande chorando e desafinando; ou uma dupla sertaneja prá mostrar o lado bem sofrido da vida na roça e do porco sangrando.
Eu prefiro um bolerão, que é prá purgar a dor toda de uma vez e tentar tirar o veneno com o dente na veia. E morro de inveja dos quadrinistas e suas capacidades de síntese.
Twitter é pinto.
Mas o gosto é de cada um.

Prá discutir a existência, a não-existência, o eu-não-eu, o vazio... Corra pro poeta europeu do século passado ou retrasado da livraria delivery mais rápida, ou faça uma busca rapidinha no Google, e tenha a certeza da mais completa tradução.
E você não estará sozinho. Vai encontrar um monte de Únicos que levaram porrada, e que planejam minuciosamente o Dia do Fim. Todos os dias.
Agora prá falar do alto da sabedoria mesmo sobre as coisas afetivas de forma bem racional, apele prá filosofia.
Infalível.
Argumentos incontestáveis explicam como é o conceito do que você pensava que sentia e não conseguia nomear.
E eles falam, falam, falam,... até você dormir em cima do livro e se dar conta de que está perdido no meio de teoremas do francês em alemão.
Se for falar de saúde é mais fácil. Basta pegar a última página do jornal e ver o que a ciência elegeu como maior inimigo e o que ela indica para o tratamento.
Convém reparar na data. Amanhã tudo se inverte. É batata.
Daí a gente vai aprendendo a buscar referências, embasamentos teóricos, ou simplesmente alimentando a preguiça de pensar uma frase sozinho.Afinal, alguém já deve ter falado sobre isso.
Mas eu juro que de vez em quando, e só de vez em quando, eu sinto um desejo enorme de ouvir o Fulano por sua própria boca.
E quando eu digo de sua própria boca, é quando o cara entende o que ele fala.
Quando tá sentindo.
Não como japonês cantando chorinho decorado.
Não como poeta analfabeto que mal sabe pontuar a batatinha que 'esparrama'.
Não como cantora gostosinha desafinada que jura que aprendeu que aquela batida pobrinha serve prá qualquer música.
Mas uma fala assim construída com suor, letrinha por letrinha, erguida meio nonsense, meio cimento-nuvem, meio hiper-real ( adoro essas coisas com 3 metades). Uma fala assim sentida 'di cum força', quase com cheiro e tudo.
Ah... Mas se eu ficar aqui descrevendo a voz que quero ouvir, como é que alguém pode se livrar do meu desejo e buscar seu próprio grito?

segunda-feira, 3 de maio de 2010

CHATO. TEM JEITO?

Uma vez perguntaram pro irmão do Henfil, o Betinho, se ele, do alto de sua nobreza, também possuía algum tipo de preconceito.
E foi aí que me redimi de todos os meus pecados seletivos, daqueles que a gente não conta pra ninguém, pois colocam uma cerca muito alta e eletrocutada separando pela diferença a gente dos outros.
Resposta dele: 'Sim. Tenho preconceito contra o chato!"
Se o Betinho pode, eu também posso.
Me liberei pra dar altos bocejos, daqueles que dão pra coçar o cérebro, e até pra dizer bastas, me levantar e ir embora, ou simplesmente pedir que quem incomodava se retirasse.

Larguei a ironia de lado, pois chato que é chato não capta quando o fora é com ele. Mudei de estratégia.
Nem quero aqui enumerar o que torna alguém chato, pois o risco de eu mesma me tornar um desses tipos abomináveis me capturaria ao certo.
Chato é chato e pronto.

Não sei se é congênito, estrutural ou genético.
Ou por simples gosto de deixar os outros exaustos pra ver até onde vai seu poder.
Falam muito, com propriedade, de tudo o que sabem. E chatos sempre sabem de tudo. Mas ocupam tanto espaço, sugam tanta energia, que a gente acaba entregando todos os pontos só pra ver se eles se cansam e vão embora.
Coisa que eles nunca fazem.
Ao contrário, elogiam você e dizem que adoraram a conversa - afinal, o ouvinte do chato geralmente é bom nisso. Escuta, escuta, ezzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzcuta........Concorda pra não discutir. E se bobear até adere ao cartão de crédito que o chato oferece, só pra ele nunca mais ligar.
Mas o que me preocupa aqui, e dessa vez queria opinião de vocês, é sobre o que fazer com o chato.
Tem remédio pra chato? Eu duvido muito.

E o que não tem jeito... Enjeitado está.
O Cazuza chegou até a fazer uma música sobre esse tema chamada 'não há perdão para o chato'. Mas acabou caindo numa chatice imperdoável. A música é terrível. Caso clássico do artista possuído pela obra.
Mas e cura? O chato tem cura?
Enquanto a gente encontra um e outro no elevador, na casa da tia, na fila de banco,... tá tudo sob controle. O relógio parece que atrasa um pouco, mas temos hora certa pro fim da tortura.
A gente atura um pouquinho, e depois vai pra casa e reclama deles, dos chatos, até pra gente se sentir muito bacana, se diferenciando dessas criaturas.
Não será isso já um certo contágio?
Chato não só cutuca, como pega.



Tem uma técnica infalível pra lidar com chato: Aperte o 'mute' e treine sua capacidade de concentração. Mas cuidado. Depois de ele explicar tudinho, certamente fará uma arguição dos pontos principais.

Vixe. Não falei que pegava?

Ó eu aqui dando aula e caindo na armadilha!

segunda-feira, 5 de abril de 2010

...É QUEM FALA.

Antigamente, quando eu ainda assistia novelas e pensava estar com a velhice tranquila, dada a minha vocação para falar com a televisão, eu me pegava morrendo de rir de algumas falas e diálogos desenvolvidos naquelas tramas.
Isto se dava quando ouvia sentenças mais ou menos com a mesma estrutura, que sempre traziam um dedinho apontado para o outro imbuídos do grau máximo da revelação.
Eram coisas do tipo:
"- Antônio Carlos, você é grande egoísta!"
Tá aí uma frase que me faz rir da condição humana.
É que o desenvolvimento dela cai sempre em contradição absurda.
Vejamos como a Glória Aparecida terminaria com isso:
"- Você é um ser que só pensa em você, no seu próprio bem."
...E o desfecho:
"- Você não pensa em mim!"
Pronto. Me escangalho de rir disso.
Tá certo, meu humor não é coisa fácil de se entender. Mas olha o que Glorinha acaba de falar:
"- Você é um egoísta porque não pensa em mim."
Não é brilhante?
Quem é o egoísta nessa história toda é que não ficou claro.
Se o Tonico, que só pensa nele mesmo, ou a Glória, que além de pensar nela, ainda quer que todo mundo pense também.
Acho que por isso cansei de novela.
Por isso perdeu a graça.
Frases como estas são tão banais e corriqueiras que a gente nem percebe quando vê coisa parecida nos jornais.
Por exemplo, quando a Igreja Católica se diz vítima de fofocas e extorsões ao se deparar com a quebra do segredinho do estupro.
Ora bolas, tem horas em que é preciso delimitar muito bem quem é a vítima e quem é réu na história.
Quem é egoísta, quem é canibal, quem abusa, quem força e quem seduz...
Homens civilizados que somos, temos a certeza de que estes enumerados são sempre os outros. Aqueles pagãos, selvagens, que ninguém quer ou protege...
Culpar a vítima de novo?
Mas as igrejas já fazem isso há tanto tempo, que nesse século chega até a perder a graça essa brincadeira.
E agora começa uma outra equação complicadinha de se fazer:
A culpa, se não é da vítima assassinada, estuprada e espancada, é de quem?
Como na novela, o macaco senta no rabo prá falar dos outros.
E como na novela também, quem bate, só age de acordo com a contingência.
O Bandido da Luz Vermelha, famoso psicopata do Rio, alegou uma vez que jamais matou ninguém, pois só quem tem o dom de dar ou tirar a vida de uma pessoa é Deus.
Ele só atirou, esfaqueou, esquartejou,... Mas quem matou foi Deus.
Assim, o mesmo não tinha culpa de nenhuma consequência que causou.
Nem questiono nada aqui de Deus ou do Diabo, pois sei que eles são maiores que eu, e fui ensinada a não fazer covardia ou burrice.
Brigar? Só com alguém do meu tamanho.
Mas acusar a vítima de egoísta por defender sua pele do lobo faminto?
Desacreditar a vítima chamando-a de louca, mal caráter ou traidora?
Isto seria reedição do abuso, vivido de novo, e de novo, e de novo...
Aí, nosso desejo é de que apareça assim, do nada, sem querer, um daqueles
fãs do Tarantino, só prá fazer uma 'Justiçazinha'
...

Ilustração de Marhcuz

segunda-feira, 8 de março de 2010

É HOJE SÓ. AMANHÃ NÃO TEM MAIS.

Contrariando as expectativas e conceitos pós-modernos, venho por meio destas mal traçadas linhas afirmar que, ao contrário do que prega a musa travestida Jane di Castro, ser mulher é muito mais do que se vestir como tal. Dizer isto, aliás, é o mesmo que um antropólogo afirmar que para ser índio, basta usar cocar. Quem pensa assim não pode ser nem antropólogo, nem índio. Prá começar, largamos com uma aparente desvantagem de ter um, e apenas um dia no ano. Mas a gente não se queixa desta festa rosa não. Afinal, nós temos um dia. É até interessante um dia separado do dia das mães, já que somos mais do que úteros peitudos ambulantes. E não é preciso parir para afirmar um gênero e uma sexualidade. Mas o dia da mulher é legal não prá fazer festa prá mais uma 'minoria', que isso é coisa de gente chata e preconceituosa, de bandeirinha na mão, e odiando tudo o que não seja de seu clubinho. Embora a gente não tenha desconto em cinema, floricultura ou sapataria, hoje o dia é de passar batom. Acho que a gente merecia o Barry White cantando em todos os alto-falantes da cidade. Ou até o Roberto Carlos, o Chico Buarque... Mas a gente se contenta com pouco. Eu só fico com pena é dos homens que estão sem um único dia pra se afirmarem como tal. Mas se tem uma coisa que mulher gosta de fazer, é ter pena de homem. Esses meninos eternamente desorientados que não tem a menor ideia do que fazer diante de um quadro desses. Esses que jamais viram seus pais beijando suas mães, e definitivamente não sabem que atitude tomar quando estão perto de uma mulher. Não me venha com a ladainha de que a mamãe traumatizou. Não falo disso. Mas agora que sumiram com nosso ponto G, me digam, o que os pobres coitados sabem fazer se digitar a senha não é mais o procedimento correto aceito por esse banco? Será que eles abrem a porta do carro? Ou isso é subjugar o poder de uma mulher abrir sua própria porta? Tanta bobagem só pra complicar uma continha que antigamente era tão fácil. será que ensinam nos livros? nos filmes antigos? O que é ser mulher ou homem? ou tudo se reduz à indumentária? 
O quadro aí de cima foi pintado por Courbet em 1866 e se chama 'A origem do mundo'. Resolvi começar o post do meu abandonado blog com ele, mostrando bem que a roupa é o que menos importa prá ser mulher, homem, travesti ou elefante.