terça-feira, 16 de junho de 2009

TRADUÇÕES



Lembro até hoje de quando li um certo autor clássico e de como me embrenhei naquelas páginas guerreiras e heróicas me sentindo das mais nobres pelo simples fato de estar eu ali, com o livro na mão, entrando numa história que não era minha. Aparentemente. Mas que me fazia entrar e ficar bem à vontade.
Pouco tempo depois sai fresquinho do forno, ao alcance de todos nas bancas de jornal, uma outra história do mesmo autor.
E eu não conseguia entrar em nada...
Lia, relia, me perdia nos parágrafos e frases mal feitos. Até que percebi que tinha nas mãos não um livro, mas uma heresia. Um pecado. Uma hýbris das mais cruéis. Assassina, esquartejadora, impossibilitadora de me dar o passe para aquela história.
Uma tradução péssima de uma obra de arte.
Larguei o livro de mão e esperei lançamento de outra editora, já que não falo grego. O que mais havia de se fazer?
Comecei então a desconfiar bastante das traduções. E a frase tão famosa que se anuncia por aí, que prá bom entendedor pingo é letra, ganhou (ou perdeu) um sentido especial prá mim dentro e fora da clínica, quando dela também desconfiei.
Não é nada raro a gente ouvir - 'Fulano disse isso, como quem quer dizer aquilo.'
Aí está o outro lado da moeda da comunicação. A da interpretação ruim. A de achar que entende tudo antes mesmo que o 'tudo' seja dito. A de decifrar o que não está escondido. A de procurar códigos, escritos, sentidos ocultos onde está tudo límpido e claro.
E assim começa um novo ciclo das traduções. Aquelas às pressas, ansiosas, quase hipermétropes, que não conseguem enxergar um palmo à frente, mas ao mesmo tempo crêem enxergar lonnnnnnnnnnge.
Tão longe que nada podem ouvir.

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