Num dos trechos mais marcantes do filme "A vida dos outros", um torturador se diverte narrando minuciosamente como ele mata suas vítimas em vida, analisando, de acordo com perfil delas, a melhor maneira de lhes infligir a dor.
Ele roubava o último fio de vida que um ser humano podia ter, assassinando e trucidando qualquer vontade, qualquer desejo, qualquer talento que o sujeito tivesse antes da tortura.
Mundando o cenário aqui e saindo da ficção, de acordo com o Dom não sei o quê de Recife e Olinda - tenho resistência a guardar nomes de quem não admiro - o estupro não é um crime tão grave. É só rever 'Má educação" e temos a posição da igreja quanto a isso facilmente revelada ali.
Aparentemente uma cena não tem nada da outra, até por ser a primeira tirada da ficção e a segunda da estatística mais cruel que se possa obter.
Só que eu não consigo diferenciar o perverso que estupra uma criança do torturador que aniquila as almas, fabricando zumbis que pastam pelo globo.
Parece que eles não têm a menor idéia do que fazem ou pregam, ao banalizar o uso à força do corpo alheio para o bel prazer, sem consentimento, sem maturação, sem nada mais.
Que a igreja tenha um olhar um tanto extraviado do que seja o corpo, tido como um fardo que deve sofrer, não é novidade prá ninguém.
Mas de onde vem a idéia de transformar vítimas em culpados? De onde vem a idéia de medir a dor do outro e de reduzi-la como se assim ela deixasse de existir, como se perdesse a importância.
Quando uma criança é estuprada, ela simplesmente perde o que há de melhor em sua vida. Ela morre um pouco. E esse pouco é tão grande que mata todo o resto.
Como é que uma criança nessas condições pode ainda acreditar em qualquer coisa? Como pode acreditar em histórias de crianças, conto de fadas, príncipe encantado? Como é que ela pode acreditar que o amor vence tudo?
E como - por favor, alguém me explique - ela pode definir o que seja ela? O que é seu corpo, onde ele começa? Onde termina?
Parece que a igreja não alcança a dimensão do que esse ato de invasão pode causar na vida de uma pessoa. Parece que ela não percebeu o homicídio em vida quando alguém submete outro ser, menor e mais fraco, a um desejo desmedido de destruição que vai muito além do sexual, pois o que se rouba não é a pureza, ou o hímen.
O que se rouba, nesses casos, é a alma.
6 comentários:
Não é à toa a debandada em massa de fiéis da igreja católica. A postura desse dom qualquer coisa aí já era anacrônica e retrógrada antes até de São Pedro. Fico com a resposta da diretora do centro de saúde: "Estou no rol dos excomungados, graças a Deus!" Tenho certeza que esse dom qualquer coisa e o chefe dele não serão aceitos nem lá embaixo. Aliás, se alguém pintar a roupa do papa de preto, vai ficar assombrado com a semelhança dele com a daquele patrão do dart vader...
A igreja católica está acabando.
Eu já excomunguei faz tempo.
E nem fui prá outra, pois demônio meu ninguém tasca.
A igreja não somente não condena o estupro como é cúmplice de diversos abusos sexuais cometidos por padres sob sua égide. Nesse caso, concordo com o que disse o jornal católico "La croix", da França: "Tem horas em que é melhor se calar". A igreja não poderia publicamente admitir o aborto, isso iria contra a doutrina. Mas poderia condenar o estuprador e ficar quieta sobre a criança. Alguém ouviu a opinião de algum pastor evangélico sobre o caso? Ou a de algum rabino?
Eu não.
Oi Alex,
o Dom põe o capeta no colo fácil, fácil. sE juntar com o papa então... melhor nem gostar do frio, pois se eles passam por vc, te queimam na certa.
Oi Flávio,
eu, nesse ponto, estou com o Voltaire. Acho que todo mundo tem que falar, pode falar, deve falar. Do jeito que souber ou puder.
Se o corpo da menina não falasse engravidando, ninguém ouviria seu pedido de socorro - ela jamais diria nada, protegendo a mãe da morte ( lembra das ameaças que a pobre sofria desde os 6 anos de idade?). E a igreja falar, mesmo que essa bobagem, é positivo também, pois assim ela mostra a cara. Aplaude quem quer, quem precisa de pastor, quem escolhe negligenciar seu poder de decisão e de escolha em nome de um lugar como ovelha ou beata.
Prá quem achar que só seguir os outros é muito pouco, o diálogo - ou o quebra-pau - é bastante construtivo.
SE a igreja não agisse, o caso seria mais um, e haveria mais um, e mais um. Mas depois da excomunhão pública, tudo e todos esses casos medonhos podem ser questionados. E, tomara, combatidos.
essa é só a minha idéia. Mas se eu não disser, como vc pode concordar ou discordar de mim?
Soraya,
Fico extremamente feliz com seu texto, pois vc. conseguiu enxergar o problema com os olhos da "Alma".
Coisa que somente hoje o Vaticano " http://noticias.uol.com.br/ultnot/ansa/2009/03/14/ult6817u2001.jhtm " teve coragem de tomar uma decisão e colocar a cara pra bater.
T++.
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